Atualmente o transtorno depressivo tem crescido em nossa sociedade, independentemente da raça, idade, escolaridade, nível socioeconômico e cultural. A depressão é definida como um conjunto de sintomas que acomete o indivíduo levando em consideração a frequência e o número de sintomas apresentados e descritos por ele. Os principais sintomas apresentados pelo paciente são o humor deprimido na maior parte do dia; diminuição ou desinteresse por atividades que antes lhe davam prazer; aumento ou diminuição do apetite; insônia ou hipersonia; agitação ou retardo psicomotor; fadiga ou perda de energia; sentimento de inutilidade ou culpa excessiva ou inadequada; capacidade de pensar ou concentrar-se diminuída; e pensamentos de morte recorrentes.
Em crianças os sintomas depressivos são relatados por meio de queixas somáticas como dores de cabeça ou na barriga; fobias, ansiedade de separação, entre outros. A criança pode apresentar comportamentos agressivos, sendo estes dirigidos aos pais e colegas ou a elas mesmas, por meio de autoagressão (machucar-se de propósito ou dar tapas e murros em si mesmo). O prazer de brincar ou ir para a escola diminui ou desaparece e as aquisições de habilidades sociais próprias da idade não ocorrem. A prática de atividades físicas e atividades diárias, que é comum e prazerosa para sua idade, diminuem ou não existem, a preocupação com os fracassos em atividades e preocupação com castigo aumenta, a ideação suicida é apresentada por meio de autoagressões como provocar arranhões, cabeçadas contra parede ou engolir objetos cortantes. Possuem grande dificuldade de convívio social devido à autoimagem, pois descrevem-se como estúpidas, bobas ou impopulares e apresentam baixa autoestima (Bahls, 2002; Mendez, 1998).
Deve-se chamara a atenção para o fato de que, muitas vezes estes sintomas passam despercebidos pelos pais ou tutores. Recentemente, Baptista e Silveira (2014) realizaram um estudo com o objetivo de analisar a percepção dos pais em relação a expressão dos sintomas depressivos e da qualidade de vida de seus filhos. Participaram da pesquisa 729 crianças e adolescentes com idade entre 8 e 18 anos e 120 pais/tutores. Foram entregues dois questionários, a EBADEP-IJ (uma escala para rastrear a sintomatologia depressiva) e a KIDSCREEN-52 (para avaliar a qualidade de vida). Para as crianças foi pedido que assinalassem as alternativas com as quais mais se identificassem em relação aos seus pensamentos e sentimentos. Aos pais pediu-se que escolhessem as alternativas que melhor condiziam com o comportamento e sentimento de seu filho(a) nas duas últimas semanas.
Por meio de analises estatísticas pode-se observar que a relação entre as respostas de pais e filhos não foram coerentes. Em relação a sintomas depressivos, as crianças apresentaram maior pontuação quando comparado à percepção dos pais. O que pode ser entendido neste caso é certa dificuldade dos pais em perceberem sentimentos negativos em seus filhos, ou seja, as crianças apontaram sentir e ou se comportar de forma negativa, enquanto seus pais não os viam por este lado, enxergando-os por um ponto de vista mais positivo, por assim dizer.
Tais resultados podem ser justificados pela diferença de comportamento e queixas entre adultos e crianças quando refere-se à depressão, considerando que, na maioria das vezes, os comportamentos como “birra”, agressões, vontade de sumir, choro fácil, muito sono ou alteração alimentar são tidos como comuns para a sociedade atualmente. Fato interessante a ser apontado na análise qualitativa feita em relação as respostas dos pais, foi possível observar que as questões relacionadas a vontade de morrer do filho, pensamentos de morte de familiares e o desejo de ficar sozinho ou fugir de casa, na maioria das vezes, foi respondido como nunca ou quase nunca no instrumento, podendo ser observado que os pais omitem ou não admitem que seus filhos sejam capazes de pensar ou sentir isso.
Corroborando tal pensamento, ao analisar os dados do questionário de qualidade de vida, encontrou-se maior relação entre as respostas das crianças e dos pais, ou seja, aspectos positivos são vistos de forma comum, o que pode ser justificado pelo fato dos pais estarem mais atentos aos momentos de lazer e de felicidade das crianças ou pelo fato de que comportamentos eufóricos sejam mais fáceis de serem observados e diferenciados dos demais. O que também pode ser salientado é o fato de muitos pais negarem que seus filhos possam estar vivendo momentos de dificuldade ou sofrimento, possivelmente por acreditarem que a infância é um momento de intensa alegria e que as crianças não têm preocupações ou medos.
A importância do estudo está no fato de que a depressão é um transtorno cada vez mais comum entre crianças e adolescentes, portanto, cabe aos pais/tutores abrirem espaço para a conversa de sentimentos e estarem sempre atentos a mudança de comportamento e queixas apresentadas pelo seu filho(a), pois desta forma, se o diagnóstico for realizado precocemente, a criança terá acesso ao tratamento adequado e consequentemente sofrerá menos danos no seu desenvolvimento.
Fernanda Silveira
Profissional de Educação Física
Mestranda em Psicologia pela USF – Universidade São Francisco